quarta-feira, 11 de novembro de 2009

A navalha de Ockham


Segunda a professora Sara Bizarro, a "navalha de Ockham", também conhecida como o princípio da parcimônia, é uma máxima que valoriza a simplicidade na construção das teorias. A formulação mais comum desta máxima é "Entia non sunt multiplicanda praeter necessitatem" ("As entidades não devem ser multiplicadas sem necessidade"). Esta formulação é freqüentemente atribuída a Guilherme de Ockham, embora ela não se encontre em nenhum dos seus escritos conhecidos. A frase de Ockham mais próxima desta máxima é "Frustra fit per plura quod potest fieri per pauciora" ("É vão fazer com mais o que se pode fazer com menos").

No entanto, ainda segundo a professora, é defensável que Ockham se referia a uma máxima bastante conhecida, visto que o princípio da parcimônia pode até ser encontrado em Aristóteles. Pensa-se, assim, que esta máxima foi associada a Ockham não por ter sido ele o primeiro a utilizá-la, mas por causa do espírito geral das suas conclusões filosóficas.

O princípio da parcimônia pode ser considerado como um princípio ontológico ou como um princípio metodológico - e os parâmetros de simplicidade requeridos podem variar entre o tipo e o número de entidades a serem admitidas. Como princípio metafísico ou ontológico a "navalha de Ockham" diz que devemos acreditar no menor número possível de tipos de objetos. Como princípio metodológico a "navalha de Ockham" diz que qualquer explicação deve apelar ao menor número possível de fatores para explicar o fato em análise.

Visão de Guilherme de ockham sobre: A separação entre Fé e Razão


Guilherme de Ockham é o último grande nome da filosofia medieval e o primeiro filósofo que encarna o que se poderia chamar de "espírito do século 14".

Levando o pensamento de Duns Scotus às últimas conseqüências, Ockham acentua a separação entre a filosofia e a teologia, entre a razão e a fé, no momento em que se anunciam as primeiras descobertas da ciência moderna.

Para Ockham, demonstrar uma proposição é mostrar sua evidência ou deduzi-la rigorosamente de outra evidente. A essa exigente concepção de prova, acrescenta-se o senso muito vivo do concreto, que faz do ockhamismo um empirismo radical.

Na opinião de Ockham, o conhecimento abstrato refere-se às relações entre as idéias, sem nada garantir sobre sua conformidade com o real. Quanto ao conhecimento intuitivo, este dá a evidência imediata, assegurando a verdade e a realidade das proposições. Só a intuição prova a existência das coisas, ponto de partida do conhecimento experimental, que, generalizando o particular, chega ao universal, à lei. É a experiência que permite conhecer as causas das coisas.

Não se trata, portanto, de conhecer o universal, mas a evidência do particular. O universal não tem realidade e a inteligência deve ser capaz de apreender o particular. Para Ockham não existem conceitos abstratos ou universais, mas apenas os termos ou nomes cujo sentido seria o de designar indivíduos revelados exclusivamente pela experiência.

Assim, o Deus de Ockham é Javé, que a nada obedece, nem mesmo às idéias, pois, eliminada a realidade dos universais, tudo se torna contingente, e poderia ser de outra maneira, se Deus o quisesse. Provada a impossibilidade de racionalizar a fé, a teologia passa a proceder exclusivamente da crença, e a filosofia, da razão.

Biografia de Guilherme de Ockham


Guilherme de Ockham (ou Occam), frade franciscano e filósofo escolástico inglês, nasceu em 1280 (ou 1288), em Ockham, um pequeno povoado de Surrey, perto de East Horsley, na Grã-Bretanha, e faleceu em 9 de abril de 1347 (ou 1349), em Munique, na Alemanha, atacado pela peste negra.

Ockham entrou para a Ordem Franciscana ainda muito jovem e foi educado em Londres, passando, mais tarde, para Oxford. Não completou seus estudos em Oxford, mas foi durante esse período e nos anos seguintes que escreveu a maioria de suas obras filosóficas e teológicas.

Suas idéias se converteram rapidamente em objeto de controvérsia. Costuma-se afirmar que o filósofo teria sido convocado a Avignon (sede temporária do papado), no ano de 1324, pelo papa João 22. Acusado de heresia, Ockham teria passado quatro anos ali, submetido a uma prisão domiciliar, enquanto seus escritos eram analisados.

Nos últimos anos, contudo, alguns pesquisadores questionam essas informações. Segundo eles, Ockham deve ter sido enviado a Avignon em 1324, mas para ensinar filosofia na famosa escola franciscana que havia nessa cidade. Ali, ganhou inimigos entre os rivais de vida acadêmica, especialmente os seguidores de são Tomás de Aquino (que havia sido canonizado por João 22 um ano antes da chegada de Ockham), alguns dos quais acusaram o filósofo inglês de ensinar heresias. Ockham teria sido convocado pelo papa não antes de 1327, mas o processo parece não ter prosseguido.

Algum tempo depois, possivelmente no ano seguinte, depois de estudar a controvérsia entre o papado e os franciscanos sobre a doutrina da pobreza apostólica, um tema caro aos adeptos de são Francisco de Assis, Ockham concluiu que o papa João 22 era um herético, posição que defendeu em sua obra.

Ockham e outros frades franciscanos fugiram de Avignon em 26 de maio de 1328, dirigindo-se a Pisa, na Itália, e conseguiram a proteção do imperador Luís 4º, da Baviera. Depois de sua fuga, Ockham foi excomungado, mas sua filosofia nunca foi oficialmente condenada. Ele passou o resto de sua vida escrevendo e se converteu no líder de um pequeno grupo de franciscanos dissidentes

segunda-feira, 19 de outubro de 2009

Razão e fé no pensamento medieval


A teologia (estudo de Deus) é a tentativa de conciliar fé religiosa e pensamento racional. Para santo Tomás de Aquino "Crer é imediatamente um ato do entendimento, porque seu objeto é a verdade, que propriamente pertence a este". "A fé é uma posse antecipada do que se espera, um meio de demonstrar as realidades que não se vêem" (Hb 11:1). Essa convicção se baseia não na evidência ou raciocínio, mas num profundo sentimento íntimo de certeza. Para a teologia cristã, a fé é sobretudo um estado de ser, no qual o homem se envolve irresistivelmente com o objeto de sua crença, convencendo-se da realidade invisível por meio de uma experiência existencial profunda. Segundo os teólogos, a fé tem por fundamento a própria palavra de Deus e não o testemunho humano. A fé cristã é a adesão do espírito a verdades reveladas por Deus e ensinadas por sua igreja. É também uma virtude, porque exige a submissão e confiança na veracidade divina. No Antigo Testamento, a fé é descrita como a submissão do homem ao Deus universal da justiça. O judeu crente esperava que essa justiça se estendesse a toda a criação e que a fraternidade acabasse reinando entre todos os homens. O Novo Testamento descreve esse mesmo envolvimento apaixonado: o Deus invisível do povo de Israel torna-se visível na pessoa de Jesus Cristo. Na Idade Média, devido ao predomínio do cristianismo e a herança do pensamento grego-romano, a relação conflitante entre a fé religiosa e a razão filosófica ocupa os pensadores cristãos. Este conflito pode ser caracterizado pelas frases de santo Anselmo e de santo Tomás de Aquino:Santo Anselmo: "Não tento, Senhor, penetrar na tua profundeza, porque de modo algum comparo a ela minha inteligência, mas desejo, ao menos, compreender tua verdade, em que meu coração crê e ama. Com efeito, não procuro compreender para crer, mas creio para compreender."Santo Tomás de Aquino: "Há, com efeito, duas ordens de verdades que afirmamos de Deus. Algumas são verdades referentes a Deus e que excedem toda capacidade da razão humana, como, por exemplo, Deus ser trino e uno. Outras são aquelas as quais a razão pode admitir, como, por exemplo, Deus, ser Deus, Deus ser uno, e outras semelhantes, Estas os filósofos, conduzidos pela luz da razão natural, provaram, por via demonstrativa, poderem ser realmente atribuídas a Deus. Embora a supracitada verdade da fé cristã exceda a capacidade da razão humana, os princípios que a razão humana têm postos em si pela natureza não podem ser contrários àquela verdade." Com esta afirmativa santo Tomás admite que a razão humana é importante para compreender as questões sobre a fé. A partir das citações acima: Havia uma preocupação entre os pensadores relativa ao conhecimento humano: para se conhecer é necessário ter fé, e a fé seria o suficiente? Não seria necessário ter também racionalidade para se conhecer? Na perspectiva agostiniana, ao homem basta ter fé, pois todo o conhecimento necessário ao homem é por Deus revelado na interação entre a alma humana e a natureza. Tanto a alma como a natureza são obras divinas, e nelas esta inscrito tudo o que é necessário ao homem saber para se ligar a Deus. A herança filosófica adotada por Santo Agostinho foi o platonismo, ou seja, Agostinho concordava com a 'teoria das idéias' de Platão, e a idéia máxima o 'Bem', Agostinho identificava com Deus. Portanto, ao homem basta dar crédito ao que sua alma tem acesso para que possa viver santamente a sua vida. Não é necessária a razão humana. Aproximadamente 900 anos mais tarde, santo Tomás de Aquino, procura conciliar a herança platônica com a herança aristotélica. Esta conciliação passa pelo resgate do uso da razão humana para o conhecimento. Chega ele a conclusão que há coisas que a razão humana dá conta de conhecer sem o auxílo da fé, por exemplo: ao homem é compreensível um Deus único, onipotente e onisciente. Por extensão é compreensível o poder máximo a um único ser, é também compreensível um ser que tenha ciência de tudo. O que foge a razão humano é o fato de um Deus ser Pai, Filho e Espírito Santo ao mesmo tempo. Neste caso, como a razão humana não dá conta de compreender, ela se cala é dá lugar a fé, daí a frase: 'Sei porque acredito.'

Fonte: http://www.philosophy.pro.br/razao_e_fe.htm





É possível comtemplar a figura de Deus racionalmente a partir da pós-modernidade ?

A gnosiologia Tomista



Diversamente do agostinianismo, e em harmonia com o pensamento aristotélico, Tomás considera a filosofia como uma disciplina essencialmente teorética, para resolver o problema do mundo. Considera também a filosofia como absolutamente distinta da teologia, - não oposta - visto ser o conteúdo da teologia arcano e revelado, o da filosofia evidente e racional.
A gnosiologia tomista - diversamente da agostiniana e em harmonia com a aristotélica - é empírica e racional, sem inatismos e iluminações divinas. O conhecimento humano tem dois momentos, sensível e intelectual, e o segundo pressupõe o primeiro. O conhecimento sensível do objeto, que está fora de nós, realiza-se mediante a assim chamada espécie sensível . Esta é a impressão, a imagem, a forma do objeto material na alma, isto é, o objeto sem a matéria: como a impressão do sinete na cera, sem a materialidade do sinete; a cor do ouro percebido pelo olho, sem a materialidade do ouro.
O conhecimento intelectual depende do conhecimento sensível, mas transcende-o. O intelecto vê em a natureza das coisas - intus legit - mais profundamente do que os sentidos, sobre os quais exerce a sua atividade. Na espécie sensível - que representa o objeto material na sua individualidade, temporalidade, espacialidade, etc., mas sem a matéria - o inteligível, o universal, a essência das coisas é contida apenas implicitamente, potencialmente. Para que tal inteligível se torne explícito, atual, é preciso extraí-lo, abstraí-lo, isto é, desindividualizá-lo das condições materiais. Tem-se, deste modo, a espécie inteligível, representando precisamente o elemento essencial, a forma universal das coisas.
Pelo fato de que o inteligível é contido apenas potencialmente no sensível, é mister um intelecto agente que abstraia, desmaterialize, desindividualize o inteligível do fantasma ou representação sensível. Este intelecto agente é como que uma luz espiritual da alma, mediante a qual ilumina ela o mundo sensível para conhecê-lo; no entanto, é absolutamente desprovido de conteúdo ideal, sem conceitos diferentemente de quanto pretendia o inatismo agostiniano. E, ademais, é uma faculdade da alma individual, e não noa advém de fora, como pretendiam ainda i iluminismo agostiniano e o panteísmo averroísta. O intelecto que propriamente entende o inteligível, a essência, a idéia, feita explícita, desindividualizada pelo intelecto agente, é o intelecto passivo, a que pertencem às operações racionais humanas: conceber, julgar, raciocinar, elaborar as ciências até à filosofia.
Como no conhecimento sensível, a coisa sentida e o sujeito que sente, formam uma unidade mediante a espécie sensível, do mesmo modo e ainda mais perfeitamente, acontece no conhecimento intelectual, mediante a espécie inteligível, entre o objeto conhecido e o sujeito que conhece. Compreendendo as coisas, o espírito se torna todas as coisas, possui em si, têm em si mesmo imanentes todas as coisas, compreendendo-lhes as essências, as formas.
É preciso claramente salientar que, na filosofia de Tomás de Aquino, a espécie inteligível não é a coisa entendida, quer dizer, a representação da coisa (id quod intelligitur), pois, neste caso, conheceríamos não as coisas, mas os conhecimentos das coisas, acabando, destarte, no fenomenismo. Mas, a espécie inteligível é o meio pelo qual a mente entende as coisas extramentais (é, logo, id quo intelligitur). E isto corresponde perfeitamente aos dados do conhecimento, que nos garante conhecermos coisas e não idéias; mas as coisas podem ser conhecidas apenas através das espécies e das imagens, e não podem entrar fisicamente no nosso cérebro.
O conceito tomista de verdade é perfeitamente harmonizado com esta concepção realista do mundo, e é justificado experimentalmente e racionalmente. A verdade lógica não está nas coisas e nem sequer no mero intelecto, mas na adequação entre a coisa e o intelecto: veritas est adaequatio speculativa mentis et rei. E tal adequação é possível pela semelhança entre o intelecto e as coisas, que contêm um elemento inteligível, a essência, a forma, a idéia. O sinal pelo qual a verdade se manifesta à nossa mente, é a evidência; e, visto que muitos conhecimentos nossos não são evidentes, intuitivos, tornam-se verdadeiros quando levados à evidência mediante a demonstração.
Todos os conhecimentos sensíveis são evidentes, intuitivos, e, por conseqüência, todos os conhecimentos sensíveis são, por si, verdadeiros. Os chamados erros dos sentidos nada mais são que falsas interpretações dos dados sensíveis, devidas ao intelecto. Pelo contrário, no campo intelectual, poucos são os nossos conhecimentos evidentes. São certamente evidentes os princípios primeiros (identidade, contradição, etc.). Os conhecimentos não evidentes são reconduzidos à evidência mediante a demonstração, como já dissemos. É neste processo demonstrativo que se pode insinuar o erro, consistindo em uma falsa passagem na demonstração, e levando, destarte, à discrepância entre o intelecto e as coisas.
A demonstração é um processo dedutivo, isto é, uma passagem necessária do universal para o particular. No entanto, os universais, os conceitos, as idéias, não são inatas na mente humana, como pretendia o agostinianismo, e nem sequer são inatas suas relações lógicas, mas se tiram fundamentalmente da experiência, mediante a indução, que colhe a essência das coisas. A ciência tem como objeto esta essência das coisas, universal e necessária.